A opção por uma aceleração do investimento público, que as instâncias europeias começaram por estimular num primeiro momento, como instrumento para tentar atenuar os impactos da crise financeira, foi mantida em Portugal para além daquilo que a experiência subsequente viria a revelar prudente. A dívida pública, que já tinha um nível elevado, acabou por disparar e a circunstância de as dívidas soberanas terem ficado por conta própria nos mercados, sem apoio multilateral significativo, induziu um acréscimo do serviço da dívida que rapidamente se tornou incomportável, deixando o país sem possibilidade de financiamento externo. O recurso a um pedido de ajuda externa, através das instituições comunitárias e do FMI, veio a tornar-se inevitável e Portugal passou por quatro anos de um duro processo de ajustamento.
Não obstante outros Estados europeus, como a Espanha ou a Itália, terem atravessado dificuldades financeiras de grande monta, só a Irlanda e a Grécia se aproximaram inicialmente, na dimensão dos problemas, daquilo que acabaria por ser a situação portuguesa. Com a recuperação mais rápida da Irlanda, a Grécia veio a destacar-se como o caso mais grave na Eurozona.
Portugal encetou, então, um doloroso percurso, com fortíssimas consequências sociais, de que, a prazo, conseguiu emergir através de um estrito cumprimento dos seus compromissos europeus. A recuperação da credibilidade financeira do país tem, contudo, a sombra permanente de uma imensa dívida pública que, nem por estar controlada, deixa de ser uma espada de Dâmocles sobre o futuro do país.
Todo o período da crise financeira e da crise das dívidas soberanas acarretou, no seio da Europa, clivagens muito profundas, pela circunstância de as instituições terem falhado tempestivamente ao teste de solidariedade coletiva que se pensava ser a matriz do próprio projeto europeu. O modo errático e hesitante como a União Europeia reagiu revelou diferenças profundas na filosofia do apoio solidário que era exigível a uma zona marcada por um projeto político comum. Ter-se-á salvado, neste contexto, o papel do Banco Central Europeu, cuja firmeza de atuação funcionou como um travão para os efeitos da política dos mercados.
Não seriam as finanças, porém, o único fator divisivo dentro da Europa. O modo como os diferentes Estados europeus reagiram às pressões das migrações económicas e à catástrofe humanitária provocada pelas vagas de refugiados que fugiam à guerra na Síria, revelou que a Europa não funciona em sintonia e que apresenta grandes debilidades no tocante à própria observância coletiva dos deveres internacionais que estão subjacentes aos seus tratados.
Neste contexto, com forte unidade nacional, Portugal tem vindo a revelar uma grande coerência na sua prática europeia, mantendo-se em estrita observância dos princípios que subscreveu.
A acrescer a este panorama cumulativo de crises, a decisão do Reino Unido de abandonar a União Europeia trouxe um novo fator de preocupação ao projeto integrador. Portugal, que tem uma relação histórica com o Reino Unido que deseja preservar, tem defendido que o processo negocial, na racionalidade dos seus termos técnicos de referência, procure salvaguardar um futuro de forte cooperação com Londres.